sábado, 26 de julho de 2008

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Movimentos Sociais| 25/07/2008 | Copyleft

REFORMA AGRÁRIA

MST volta a criticar ação da Brigada Militar no RS

Marcha de agricultores sem-terra em defesa da reforma agrária só conseguiu entrar na capital gaúcha, depois de uma sessão de revista, filmagens e fotografias na entrada da cidade. “A Brigada Militar teve uma ação ridícula, como em todas últimas vezes. É tudo articulado para humilhar o trabalhador sem terra e taxá-lo de violento", criticou Inês Rodrigues, do Movimento dos Sem Terra.

PORTO ALEGRE - Cerca de 800 trabalhadores sem terra chegaram ao centro da capital gaúcha, na manhã de quinta-feira, para participar de uma audiência pública com a presença do Ministério Público Federal e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A caminhada, que começou na última terça-feira em Nova Santa Rita, é pelo cumprimento do Termo de Ajuste de Conduta (TAC), assinado pelo Incra junto ao Ministério Público. Sem data definida para sair, o Movimento está acampado no prédio do Instituto.

Desde quarta-feira à noite, coordenadores do MST já sabiam que chegar a Porto Alegre para participar da audiência pública não seria tarefa fácil. O comandante da BM, coronel Paulo Roberto Mendes, já havia anunciado que impediria a marcha de entrar na cidade. Logo após, afirmou que o órgão não havia recebido "nenhum aviso" sobre a manifestação. Mendes orientou o 9º Batalhão de PM a registrar ocorrência no Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca), no caso de menores de 18 anos participarem da passeata.

“A Brigada Militar teve uma ação ridícula, como em todas últimas vezes. É tudo articulado para humilhar o trabalhador sem terra e taxá-lo de violento. A Brigada Militar já tinha acompanhado o carregamento do nosso material em Canoas. Aqui, fomos revistados na entrada de Porto Alegre”, contou Inês Rodrigues. Conforme ordem do comandante da BM, só depois de todos trabalhadores serem abordados e revistados, é que a marcha entrou na cidade. Inclusive crianças foram revistadas durante a ação. Foram identificados policiais sem farda em serviço, fazendo fotografias e filmando os manifestantes.

“Queremos dizer que essa não é uma postura somente contra nós. Se isso continuar, qualquer pobre vai apanhar da polícia na rua. O diálogo com a sociedade deve ser de mostrar que isso é uma prática de governo. O Governo Yeda assume publicamente que está associado à monocultura de eucalipto. O que deveria ser segurança pública é, na verdade, violência contra o cidadão”, contestou Inês Rodrigues.

A principal reivindicação dos trabalhadores sem terra que estão acampados no Incra é de que o Governo Federal apresse o assentamento de mil das 2,5 mil famílias acampadas à beira de estradas no Rio Grande do Sul. A decisão de acampar nos corredores do edifício de oito andares, localizado na região central da capital gaúcha, foi o último ato de uma manifestação que havia começado ao amanhecer, quando o grupo deixou o ginásio do Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas (RS) e iniciou uma caminhada de 12 quilômetros, entre a região metropolitana e a capital do estado. “Não temos data para sair aqui do Incra. Queremos acompanhar o processo de aquisição de terras”, assegurou Inês Rodrigues, uma das integrantes do MST que participa da ocupação do Incra.

Conforme o TAC, o Governo Federal deveria assentar mil famílias até abril e outras mil famílias antes do final deste ano. Até o momento, de acordo com a coordenadoria do MST no Rio Grande do Sul, menos de 40 famílias de agricultores foram assentadas no período. O superintendente regional do Incra, Mozar Dietrich, informou que o prazo para o assentamento de mil famílias, segundo acordo fechado em novembro e vencido em abril, teve de ser prorrogado até setembro porque o instituto encontrou dificuldades para desapropriar e adquirir terras no Estado. Segundo ele, a intenção é que seja encontrada uma solução para estas famílias dentro deste prazo.

“O trabalhador na cidade está pagando mais caro pela comida porque as terras estão sendo utilizadas para plantar mais eucalipto e mais soja para combustível, diminuindo os alimentos”, disse Ana dos Santos. “Com a reforma agrária, podemos gerar mais emprego e produzir mais alimentos, como os assentamentos da região de Porto Alegre que produzem 2 milhões de toneladas de arroz ecológico”, exemplifica Ana, da coordenadoria estadual do MST.

Ações acontecem desde segunda-feira, em todo Brasil
Desde a última segunda-feira, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra vem ocupando superintendências do Incra. Em São Paulo, Alagoas, Paraíba, Bahia, Maranhão, Ceará e Goiás, manifestantes exigem o assentamento das 140 mil famílias acampadas e um programa de agroindústria para assentados. “A Reforma Agrária está parada em todo o país. Exigimos o assentamento das famílias acampadas e um programa de agroindústrias para nossas áreas”, afirma José Batista de Oliveira, da coordenação nacional do MST. Em Alagoas, por exemplo, a ação conjunta do MST com a Pastoral da Terra fez com que mais de 80 famílias ocupassem a Fazenda Carolina, no município de Teotônio Vilela.

Foto: Eduardo Seidl

domingo, 13 de julho de 2008

Folha de São Paulo, 13/07/08
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1307200808.htm
TENDÊNCIAS/DEBATES

Crônica de uma liberdade anunciada

FREI BETTO


Não houve surpresa. O corruptor pau-mandado disse que só a primeira instância preocupava o chefe. Dito e feito, 2 vezes

NÃO HOUVE surpresa. O corruptor pau-mandado disse com todas as letras, gravadas pela Polícia Federal, que o chefe se preocupava "apenas com o processo em primeira instância, uma vez que no STJ e no STF ele resolve tudo".
Sabia o que dizia. Dito e feito, em dose dupla. O chefe entrou na lista daqueles que, para certos ministros do STF, pairam acima da lei e reforçam a nociva cultura de que, como cantava Noel Rosa, "para quem é pobre a lei é dura", mas para quem é rico a impunidade fa(r)tura.
Vale a piada do político corrupto que surpreendeu o filho surrupiando-lhe a carteira e deu-lhe umas palmadas. "Mas você também rouba!", reagiu o menino. "Não te castigo por roubar, mas por se deixar apanhar em flagrante", retrucou o pai. Agora, nem o flagrante merece punição. Vide as imagens gravadas pela PF em que aparece a dinheirama destinada a corromper um delegado daquele órgão. O ciclo vicioso se confirma: a Polícia prende, a Justiça solta. E alguns disso se aproveitam e fogem.
Ou a pena prescreve, sacramentando a impunidade e permitindo até que se candidatem a cargos públicos.
A corrupção, aliada à impunidade, de quem é filha, já indignava o autor de "A Arte de Furtar", escrito entre os séculos 17 e 18: "Se vossa casa, ontem, era de esgrimidor, como a vemos hoje à guisa de príncipe? E até vossa mulher brilha diamantes, rubis e pérolas, sobre estrados broslados? Que cadeiras são essas que vos vemos de brocado, contadores da China, catres de tartaruga, lâminas de Roma, quadros de Turpino, brincos de Veneza etc.?
"Eu não sou bruxo nem adivinho; mas me atrevo, sem lançar peneira, a afirmar que vossas unhas vos granjearam todos esses regalos para vosso corpo, sem vos lembrarem as tiçoadas com que se hão de recambiar no outro mundo. Porque é certo que vós os não lavrastes, nem os roçastes, nem vos nasceram em casa como pepinos na horta".
E aponta as ramificações do enriquecimento ilícito nas estruturas de poder: "Furtam pelo modo infinito, porque não tem fim o furtar com o fim do governo e sempre lá deixam raízes, em que vão continuando os furtos. Finalmente, nos mesmos tempos não lhes escapam os imperfeitos, perfeitos, mais-que-perfeitos e quaisquer outros, porque furtam, furtaram, furtavam, furtariam e haveriam de furtar mais, se mais houvesse".
Em "A Desordenada Cobiça dos Bens Alheios - Antiguidade e Nobreza dos Ladrões" (1619), Carlos García diz que a arte da ladroagem é superior à alquimia, pois do nada faz tudo: "Haverá maior nobreza no mundo que ser cavaleiro sem rendas e ter os bens alheios tão próprios que se pode dispor deles a seu gosto e vontade, sem que lhe custe mais que pegar-lhes?".
E denuncia o engano em que muitos vivem, "crendo que foi a pobreza a inventora do furto, não sendo outros senão a riqueza e a prosperidade".
Padre Vieira, nascido há 400 anos, alerta em seu "Sermão do Bom Ladrão" (1655): "Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco, estes, sem temor nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados, estes furtam e enforcam".
Sim, não temem as instâncias superiores da Justiça, pois não há o perigo de ficarem atrás das grades. Soltos, continuam a furtar o erário, e enforcam, nas negociatas, a cultura da decência, da ética e da justa legalidade.
E ainda há quem proteste por ver a mídia acompanhar as operações policiais. Quem reclama quando as viaturas cercam a favela com brucutus e "caveirões"? Reza o direito que, se o crime é clandestino, a repressão e a punição devem ser públicas, para servir de exemplo e coibir potenciais bandidos, sejam eles de chinelos de dedo ou de colarinho-branco.
Segundo Cícero, "o maior estímulo para cometer faltas é a esperança de impunidade". Enquanto o nosso Código de Processo Penal não sofrer profundas modificações, os bandidos poderão repetir em entrevistas que só temem a Polícia, porque a Justiça é cega às suas práticas criminosas.
Talvez fosse mais sensato acatar a proposta de Capistrano de Abreu e reduzir a Constituição a dois artigos: "Artigo 1º: Todo brasileiro é obrigado a ter vergonha na cara. Artigo 2º: Ficam revogadas todas as disposições em contrário".


CARLOS ALBERTO LIBÂNIO CHRISTO , o Frei Betto,63, frade dominicano e escritor, é autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros. Foi assessor especial da Presidência da República (2003-2004).

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Agência Carta Maior, 07/07/08
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PERSUASÃO PARA O CONSUMO

72% das propagandas de alimentos vendem más opções à saúde

Uma pesquisa realizada na Universidade de Brasília revela que 72% das propagandas de alimentos veiculam mensagens para o consumo de produtos com altos teores de gorduras, açúcares e sal. Essa "dieta" contribuiu para o aumento de doenças crônicas como obesidade, hipertensão e diabetes.

BRASÍLIA - Uma pesquisa feita pelo Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan) da Universidade de Brasília (UnB) revela que as propagandas sobre alimentos no Brasil sugerem opções que fazem mal à saúde dos consumidores. Os dados preliminares do estudo foram divulgados no dia 26 de junho. O levantamento, intitulado Pesquisa de monitoração de propaganda de alimentos visando à prática da alimentação saudável, foi feito entre 2006 e 2007 com recursos do Ministério da Saúde/CNPq.

Para fazer análise das peças publicitárias, professores, alunos e
recém-formados do Departamento de Nutrição gravaram durante 52 semanas 20 horas diárias da programação de canais televisivos abertos e fechados. Também foram arquivados nesse período revistas voltadas tanto para o público adulto em geral, feminino e infantil. Os resultados constados
pelos pesquisadores assustam. 72% do total das peças publicitárias de
alimentos, veiculam mensagens para o consumo de alimentos com altos
teores de gorduras, açúcares e sal.

Este valor é alcançado com a publicidade de apenas cinco categorias de
alimentos: na ordem, os campeões são fast food; guloseimas (balas,
chicletes) e sorvetes; refrigerantes e sucos artificiais; salgadinhos de
pacote, e biscoitos (doces e recheados) e bolo. "Isso contribui para o
aumento crescente e assustador da prevalência das doenças crônicas não
transmissíveis como obesidade, hipertensão e diabetes", declara a
professora Elisabetta Recine, uma das coordenadoras da pesquisa. "E
subsidia a discussão sobre a urgência de se regulamentar a publicidade de
alimentos.".

Público infantil
Nos canais de TV a cabo destinados preferencialmente ao público infantil a pesquisa chegou a verificar que 50% das peças publicitárias nessas redes são de alimentos. "Isso mostra nitidamente o direcionamento da publicidade para esse público, no sentido de estimular consumo e formar hábitos alimentares não saudáveis", analisa a professora. Reunindo canais abertos e fechados, 44% do total desse tipo de propaganda é direcionada às crianças. "O dado é incontestável, porque praticamente metade da publicidade de alimentos na mídia televisiva e dirigida ao público infantil. Por isso identificamos atualmente casos de obesidade, hipertensão e colesterol alto em crianças e com prevalência cada vez mais altas", avalia.

Quando se trata da análise do conteúdo publicitário destinado à criança,
é alta a ocorrência de peças publicitárias com promoções de estímulo à
compra, como, por exemplo, a inclusão de bonecos e figurinhas nas
embalagens. "Em torno de 20% das propagandas contêm algum tipo de
promoção", afirma Elisabetta.

Mídia impressa
A realidade da publicidade alimentícia em revistas não é diferente. Cerca de 15% do total de peças nesses veículos relacionam-se a produtos alimentícios. Em revistas infantis, como as de história em quadrinhos, esse número é um pouco maior, fica em torno de 18%.

Esses são apenas alguns dos dados preliminares da pesquisa, que tem a
intenção de entrar a fundo no mundo publicitário para desvendar elementos persuasivos não tão perceptíveis à primeira vista. "Vamos analisar o tipo de mensagem que é enviada a cada público, os recursos para chamar a atenção, os valores estimulados", explica Elisabetta. "A meta é entrar nessas estruturas para detalhar quais são os mecanismos utilizados para conquistar o consumidor", afirma.

Financiada pelo Ministério da Saúde/CNPq, a pesquisa tem o objetivo de
contribuir para a discussão sobre a regulamentação da publicidade de
alimentos e apontar estratégias para produção de uma futura
regulamentação. "Muitos países controlam e até mesmo proibiram a
publicidade de alimentos na TV. Há outros que controlam essas propagandas em determinados horários, como o de programação infantil", afirma a pesquisadora.

Quadro
- 20% da programação das TVs são ocupadas por publicidade. Desse total,
10% é sobre alimentos;

- Foram analisados quatro canais de TV, sendo dois abertos e dois
fechados;

- Nos canais fechados, 50% da publicidade é voltada para o público
infantil;

- A gravação foi feita durante 20 horas durante sete dias de 52 semanas
(entre agosto de 2006 e agosto de 2007), totalizando 4.160 horas de
material coletado;

- Neste mesmo período foram analisadas 18 revistas, sendo 3 destinadas ao público adulto, 8 para o feminino, duas para adolescentes e seis para
crianças;

- Cinco categorias de produtos (fast food; guloseimas e sorvetes;
refrigerantes e sucos artificiais; salgadinhos de pacote, e biscoitos e
bolo) são responsáveis por 72% das propagandas de alimentos;

- Reunindo canais abertos e fechados, 44% do total de propagandas de
alimentos é direcionado às crianças;

- Na mídia impressa, cerca de 15% do total de peças publicitárias são de
alimentos;

- Em revistas infantis, esse número é um pouco maior, fica em torno de
18%;

Integram a equipe de coordenação da pesquisa, Elisabetta Recine, Janine Coutinho e Renata Monteiro, do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição, da Universidade de Brasília.

Fonte: Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição / UNB