quarta-feira, 21 de abril de 2010

http://coletivodar.wordpress.com/2010/04/19/mais-cedo-ou-mais-tarde-a-estupidez-da-politica-vigente-ha-de-se-desmascarar-entrevista-com-luiz-eduardo-soares/

“Mais cedo ou mais tarde a estupidez da política vigente há de se desmascarar” – Entrevista com Luiz Eduardo Soares

“É preciso tirar do armário as vozes libertárias, anti-proibicionistas. Elas precisam correr riscos mas têm de se pronunciar com desassombro e clareza”

O cientista político e antropólogo Luiz Eduardo Soares é muito mais do que um acadêmico engajado intelectualmente contra o proibicionismo (o que já seria ótimo). Viveu, digamos assim, “o lado de lá”, e sentiu na pele os entraves institucionais kafkanianos que impedem o poder público de atacar os probelmas que realmente importam. Foi secretário de segurança do rio de Janeiro e Secretário Nacional de Segurança Pública. Com esta experiência, pode dizer explicar a situação com clareza, como quando aponta que ” O que se passa é o seguinte: milhares de jovens pobres são capturados com drogas e, independentemente da quantidade, são rotulados como traficantes e trancafiados nessas entidades, que muitas vezes não passam de simulacros de prisões. São, assim, praticamente condenados a uma carreira no crime”.

Nesta entrevista concedida ao DAR, aponta não só os efeitos do proibicionismo e seu fracasso, como os limites de uma concepção política que encara punição e justiça como sinônimos, segurança e arbítrio como causa e consequência. Além de esboçar propostas de alternativas, como “ajustar as contas com a segurança e a justiça criminal, isto é, estender a transição democrática a essas áreas, mudando-as em profundidade. A começar pelo modelo de polícia que herdamos da ditadura e permanece intocado”.

Confira abaixo a íntegra da conversa com o autor de, entre outras obras, Elite da Tropa e Meu casaco de general: 500 dias no front da Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro

DAR – Como avalia o estágio atual de penetração do debate de drogas na sociedade brasileira? Acredita que houve avanço nos últimos anos?

Luiz Eduardo Soares – Debate? Que debate? O que há é a movimentação de grupos bastante específicos e um ou outro editorial na grande imprensa. Fora isso, o que há são os pesquisadores devotados e respeitáveis e a admirável e incansável militância anti-proibicionista. O resto é marasmo, são platitudes preconceituosas, retórica conservadora com tinturas diversas, estigmas e a pasmaceira de sempre ante a máquina feroz de morte e irracionalidade da política vigente, que criminaliza os jovens pobres e negros, estimula a corrupção policial, o domínio territorial pelo tráfico e o comércio ilegal de armas, com seus corolários sangrentos.

- Por que ainda há tanta resistência – mesmo nos ditos setores “progressistas” – quanto a enfrentar com seriedade este debate? A quem interessa a manutenção do atual status proibicionista?

Luiz Eduardo Soares – A rigor a situação atual não interessa a ninguém, salvo os segmentos corruptos da polícia, das milícias e dos políticos a eles aliados. O senso comum supõe que tudo o que existe expressa algum interesse e se realiza segundo determinado projeto de poder. Não é assim. Há efeitos perversos e efeitos de agregação, como dizemos os sociólogos. Ninguém com autoridade para mudar dispõe-se a agir por razões eleitoreiras, uma vez que formou-se uma opinião majoritária inteiramente reacionária, nessa matéria, apoiada em mitos, erros empíricos e ignorância da realidade mundial e dos resultados das pesquisas.

Para comprová-lo, basta ler o que escreveu Cesar Maia, dirigente do DEM, em seu ex-Blog. Disse que o ex-presidente FHC, ao criticar a política repressiva da guerra às drogas e reconhecer a necessidade de mudanças, ainda que tímidas, estaria prestando um desserviço à oposição, porque 80% da sociedade brasileira e 95% dos setores mais pobres eram contrários a qualquer mudança liberalizante. Cesar Maia condenava FHC por mexer em casa de marimbondo e se isolar, na opinião pública. Ou seja, segundo Cesar o líder político não deve ter compromisso com o que seja justo, necessário e verdadeiro, mas com o que seja eleitoralmente conveniente e palatável. Claro que assim não vamos a lugar nenhum. Mesmo fora da política partidária, há uma certa política na sociedade que amarra lideranças sociais aos tabus anti-drogas, subtraindo-lhes coragem de se pronunciar contra a corrente dominante.

É como as questões do aborto, da homofobia ou das políticas afirmativas contra o racismo. Não se trata apenas de troca de informações, idéias, conhecimento e opiniões, mas de valores arraigados com base em símbolos e tabus vigorosos. Os críticos se sentem envergonhados e se submetem à silenciosa pressão da maioria. Portanto, é preciso tirar do armário as vozes libertárias, anti-proibicionistas. Elas precisam correr riscos mas têm de se pronunciar com desassombro e clareza. Defender a descriminalização das drogas ou sua legalização não significa que se esteja elogiando as drogas, estimulando seu consumo ou admitindo que se consome. Eu, por exemplo, assumo publicamente essa posição minoritária desde os anos 1970. Não uso drogas nem bebo. Mas não admito que o Estado interfira em minhas decisões privadas. E repudio a hipocrisia que libera o cigarro e o álcool e proíbe a maconha, por exemplo. Assim como me nego a aceitar que um adolescente pobre e negro, de 18 anos, seja declarado criminoso e enjaulado porque vendeu maconha a outro, da mesma idade, mas de outra classe social e outra cor de pele, paternalísticamente definido como vítima: o consumidor. Bem, mas aí já entramos na discussão substantiva.
- Ultimamente a mídia tem dado destaque a movimentações institucionais e parlamentares no sentido de mudanças na atual lei drogas. Acredita na viabilidade dessas mudanças? Se sim, até onde elas iriam num primeiro momento?

Luiz Eduardo Soares – A atual política é um rotundo e eloqüente fracasso. Não só no Brasil. Por outro lado, o mal que a atual política de drogas provoca está aí, à vista de todos. Acredito que contra os tabus e a ignorância, contra a demagogia e o oportunismo eleitorais, contra o moralismo reacionário predominante, contra o populismo penal ainda há de se afirmar uma posição mais sensata, um pouquinho mais sensata. Acho que mais cedo ou mais tarde a estupidez da política vigente há de se desmascarar, revelando-se como aquilo que é. E creio que, apesar de tudo, haveremos de avançar, como avança o mundo à nossa volta, da Argentina à Suiça, de Portugal à Holanda. Não tenho dúvida que mesmo nos EUA –matriz do atraso e do obscurantismo nessa matéria– há uma consciência crítica bastante forte, inclusive dentro das polícias e do governo, mas a coalizão da direita não cessa de freiar o processo com suas chantagens.

Enfim, acredito que haverá progresso, ainda que não linear. O processo vai ser difícil, tormentoso e pleno de contradições. Hoje, o que parece começar a avançar é a descriminalização do usuário. Bem, acho que está errado em sua unilateralidade e que é injusto, mas não nego que seja melhor do que nada e que possa servir à abertura de portas para avanços mais consistentes no futuro.

- Com sua experiência como gestor público, que tipo de efeitos a chamada Guerra às drogas tem sobre a segurança pública?

Luiz Eduardo Soares – A guerra às drogas, no Brasil (e não só), tem os efeitos mais nefastos: estimula a corrupção policial e o desenvolvimento das milícias, e alimenta o tráfico de armas, sem o qual não haveria tanta violência letal, nem o domínio territorial, que veta a milhões de pessoas o acesso aos benefícios derivados do estado democrático de Direito. Além disso, há dinâmicas políticas brutais e degradadas, decorrentes desses fenômenos que acabo de enumerar. E mais: avança a criminalização da pobreza. Desafio qualquer leitor a encontrar um adolescente de classe média, branco e bem posto na vida, que esteja internado numa entidade sócio-educativa. Se houver será a exceção a confirmar a regra.

O que se passa é o seguinte: milhares de jovens pobres são capturados com drogas e, independentemente da quantidade, são rotulados como traficantes e trancafiados nessas entidades, que muitas vezes não passam de simulacros de prisões. São, assim, praticamente condenados a uma carreira no crime. O jovem rico e branco, capturado com a mesma quantidade, ou é solto mediante a propina paga pelos pais, ou é classificado como “dependente”, “viciado”, usuário, consumidor. Resultado: vai para casa. Isso é o que acontece, porque a legislação faculta ao juiz arbitrar se a quantidade recolhida com o capturado indicia tráfico ou consumo.

E atenção: a imagem usual do vendedor de drogas como o dragão da maldade, crudelíssimo e violento, é uma construção social estigmatizante que costuma ser aplicada de modo generalizante e que funciona como instrumento de reprodução de preconceitos e desigualdades sociais. Raros são aqueles que agem em conformidade com a descrição que identifica o sujeito com a monstruosidade inumana.

- De que forma e por que as políticas repressivas atuam de maneira tão seletiva, incidindo prioritariamente sobre os pobres? Por que as políticas de segurança pública são tão voltadas para a saída penal? Como fazer para alterar esse quadro?

Luiz Eduardo Soares – A sociedade e, por extensão, nossos políticos, em sua maioria, tendem a confundir justiça com punição e punição com privação de liberdade. Ficam de fora todas as dimensões da reparação da vítima, de prevenção da violência e do crime, e de construção de novas oportunidades e vias a quem transgrediu as leis ou as regras do convívio social. A lei, em sua forma pura e ideal, é igual para todos –afinal, justiça é equidade. No entanto, como nossa estrutura social é muito desigual–e nossa cultura consagra muitas delas–, e como nossas instituições de segurança e justiça criminal (assim como as políticas penais e de segurança) são fortemente marcadas por tais estruturas e por tal cultura, as leis, quando são aplicadas, submetem-se à refração imposta por filtros de classe, cor, idade, gênero, opção sexual, religião e outros. Daí a dramática desigualdade no acesso à Justiça –que talvez seja a forma mais deletéria e dura de nossas desigualdades e a mais negligenciada, até porque corrói a legitimidade da institucionalidade política–, que começa na abordagem policial e termina na prolatação das sentenças e em sua execução no sistema penitenciário, que é a negação selvagem de nossas pretensões civilizacionais. O que e como fazer? Ajustar as contas com a segurança e a justiça criminal, isto é, estender a transição democrática a essas áreas, mudando-as em profundidade. A começar pelo modelo de polícia que herdamos da ditadura e permanece intocado.
- Quais os principais avanços que uma mudança na proibição das drogas traria? Como se enfrentaria o problema no abuso do uso, por exemplo?

Luiz Eduardo Soares – Sejamos pragmáticos: o verdadeiro debate não é “devemos ou não proibir o acesso às drogas”, do álcool à cocaína. Não é esse o debate porque a hipótese do impedimento desse acesso não existe, na realidade prática. Ou seja, o acesso é um fato em todo mundo democrático ou não totalitário e teocrático. E não porque as polícias sejam incompetentes. Os EUA gastaram 500 bilhões de dólares na guerra às drogas, desde sua declaração, em meados dos anos 1990. Mesmo assim, o consumo não foi alterado. Portanto, não se pode dizer que faltou dinheiro, pessoal, equipamento, qualidade tecnológica, competência técnica, nada disso. O fato é que é simplesmente impossível controlar uma dinâmica desse tipo, quando, na sociedade, há demanda e oferta. O fato é este. Ponto final. Sejamos realistas. Rendamo-nos aos fatos.

Aliás, no fundo o que esse fato demonstra é muito bom: a sociedade vence o Estado, para o bem e para o mal. De todo modo, é necessário ter os pés no chão e reconhecer os fatos como eles são. A verdadeira questão sempre mascarada é a seguinte: como não está ao nosso alcance impedir o acesso às substâncias que chamamos drogas, temos de nos perguntar: em que contexto jurídico-político seria preferível vivenciar esta iniludível realidade? Dizendo-o de outro modo: em que contexto normativo seria menos mau lidar com a realidade do acesso às drogas? O contexto atual, em que drogas são problema de polícia e cadeia, isto é, de política criminal? Ou um contexto diferente em que elas fossem objeto de saúde pública e educação? Eu aposto no segundo caminho. Ele não vai evitar o abuso, mas pelo menos não vai provocar outros males. Das drogas e de seus efeitos destrutivos nós nunca nos livraremos, mas poderemos aprender a conviver melhor com elas, a ponto, inclusive, de reduzir o sofrimento humano que seu abuso provoca.

Vejamos o caso mais grave: o álcool. Há, no Brasil, mais de 15 milhões de alcoólicos e, mesmo assim –felizmente– ninguém está propondo a proibição e a criminalização do usuário. A não criminalização tem impedido o abuso, a dependência? Não. Mas acho que todos concordariam que a via da criminalização tampouco resolveria o abuso e ainda implicaria conseqüências coletivas desastrosas. Eis, por fim, um exemplo virtuoso e uma lição: temos diminuído bastante o consumo de cigarro com políticas inteligentes que disciplinam a venda e o consumo, e criam um ambiente cultural avesso ao uso. Esse é o caminho.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u722246.shtml
17/04/2010 - 07h30

Prisões e Justiça criminal do Brasil são disfuncionais, diz relatório


ANDRÉ MONTEIRO
da Reportagem Local

Relatório elaborado pela Associação Internacional dos Advogados (IBA, na sigla em inglês) afirma que o sistema prisional e a Justiça criminal brasileira são "disfuncionais". Nesta semana o país sedia o 12º Congresso da ONU de Prevenção ao Crime e Justiça Criminal, em Salvador (BA), e o Conselho Nacional do Ministério Público reúne mais de cem promotores e procuradores em Brasília para discutir o sistema carcerário.

Ministério diz enfrentar problema prisional de forma contundente
No Brasil não existe política penitenciária, diz delegado

No mês passado, um painel paralelo ao Conselho de Direitos Humanos da ONU e uma comissão da OEA (Organização dos Estados Americanos) já haviam discutido o tema, após denúncias sobre detentos amontoados em prisões no Espírito Santo.

O estudo internacional cita as denúncias no Estado, mas aponta que os problemas são generalizados no país. "A superlotação extrema, condições sanitárias precárias, violência entre organizações criminosas e motins deterioram o sistema prisional, onde os maus-tratos, incluindo espancamentos e tortura, são comuns."

Publicado pelo Instituto de Direitos Humanos da IBA em fevereiro, o relatório diz ainda que "o sistema de Justiça criminal brasileiro parece ser tão ruim em punir os culpados quanto em proteger os inocentes". O Ministério da Justiça diz enfrentar o problema de forma contundente.

O relatório cita exemplos de violência dentro das prisões, como o caso dos 25 detentos queimados em Ponte Nova (MG) em agosto de 2007, e até os ataques do PCC em maio de 2006 como reflexos da crise do sistema criminal no país.

Com base em entrevistas com o Ministério da Justiça e o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o instituto estima que "dezenas de milhares de pessoas condenadas à prisão, na realidade, não cumprem as suas penas devido à lentidão dos processos judiciais, à ineficiência administrativa dentro do sistema e aos baixos padrões de segurança."

Por outro lado, aponta o dado do CNJ --que serviu de título ao relatório-- de que está na prisão irregularmente um a cada cinco presos, a maioria sem assistência jurídica.

"Devido ao excesso da população prisional, muitos presos em regime de prisão provisória estão detidos em delegacias e carceragens. Essas não são concebidas como prisões, e raramente são equipadas com instalações adequadas para manter indivíduos presos por longos períodos, o que aumenta o risco de que os presos sejam submetidos a maus-tratos." A IBA afirma que uma visita a uma "cadeia da polícia no Rio, durante a pesquisa, mostrou condições que se encaixam no padrão geral" descrito pelo relatório. A Polícia Civil confirma a situação.

Ao citar a dificuldade de encontrar informações precisas e atualizadas sobre a população carcerária, os autores do relatório afirmam que "nenhuma quantidade de novas leis ou de novas instituições pode solucionar ineficiências e a incompetência; elas poderiam, de fato, agravar a situação existente ao acrescentar novas camadas de burocracia e confusão administrativa àquelas que existem atualmente."

Entre as soluções para a crise, o relatório recomenda uma reforma para aumentar a eficiência do Judiciário, o desenvolvimento de alternativas à detenção, o combate ao crime com um policiamento mais eficaz, e o fortalecimento da Defensoria Pública.

Entretanto, a IBA afirma que "há limites quanto a quão eficazes as soluções importadas podem ser", e sustenta que a saída deve passar por "soluções práticas de origem doméstica".

Financiamento

Fundada em 1947, a IBA reúne cerca de 35 mil advogados e 197 associações em todo o mundo. O relatório foi financiado pela ONG Open Society Institute, do megainvestidor George Soros, e cita, além da pesquisa própria, levantamentos de entidades como Anistia Internacional, Human Rights Watch, Pastoral Carcerária, Justiça Global e ONU.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2104201005.htm
Justiça argentina condena ex-ditador

Reynaldo Bignone, 82, recebe sentença de 25 anos de prisão por crimes contra a humanidade cometidos em centro de tortura clandestino

Tribunal determina ainda que militar não pode cumprir a pena em prisão domiciliar; revogação de leis de anistia possibilitou o julgamento


SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

Reynaldo Bignone, último general a presidir a Argentina durante a mais recente ditadura militar do país (1976-1983), foi condenado ontem a 25 anos de prisão, por crimes contra a humanidade cometidos no Campo de Maio, centro clandestino de tortura do regime.
O tribunal federal que julgou Bignone, 82, determinou que ele cumpra a pena em prisão comum, revogando a prisão domiciliar à qual estava submetido por outros crimes pelos quais já havia sido condenado.
A decisão foi saudada pelo secretário de Direitos Humanos do governo Cristina Kirchner, Eduardo Luis Duhalde, como "exemplar" e demonstrativa de "um novo avanço na luta contra a impunidade".
A punição dos responsáveis por violações de direitos humanos durante a ditadura é uma bandeira do casal Kirchner -no governo de Néstor, antecessor de Cristina, foram revogadas as leis de anistia promulgadas durante a gestão de Raúl Alfonsín, primeiro presidente eleito após a ditadura. Desde a revogação, em 2005, já foram reabertos mais de mil processos contra repressores.
A leitura da sentença contra Bignone, transmitida ao vivo por rádios e TVs, foi acompanhada por diversos representantes de associações que reivindicam a punição dos responsáveis pelos crimes da ditadura, como as Avós da Praça de Maio, que festejaram a decisão.
Em seu depoimento, Bignone classificou o período da ditadura como uma "guerra irregular" na qual as Forças Armadas "tiveram que intervir, para derrotar o terrorismo".
Ele denominou como "legítimas" as ordens de repressão que deu durante o período, negando tratar-se de crimes.
O ex-ditador questionou as cifras que apontam 30 mil civis argentinos desaparecidos pelo regime militar e 500 bebês de militantes políticos nascidos sob a guarda do Estado e apropriados ilegalmente pelas Forças Armadas.
Bignone afirmou que "nunca se demonstrou [ter havido] mais de 8.000 desaparecidos" pelo regime e disse que a apropriação de bebês "não chegou a 30, nenhuma delas cometida por contingente militar".
Diversas vezes vaiado pela plateia, o ex-ditador rechaçou o tratamento de genocida. "Rotulam-nos de repressores e genocidas. Em princípio, o termo repressão não é uma desqualificação. A autoridade tem o dever de reprimir delitos de qualquer natureza. [O termo] genocida não resiste à menor análise, porque o que houve em nosso país não se enquadra minimamente na definição internacional de delito de genocídio. Somente porta-vozes do ódio podem defender isso", afirmou.
Além de Bignone, também receberam a pena de 25 anos de prisão, por crimes cometidos entre 1976 e 1978 no Campo de Maio, os militares Santiago Riveros e Fernando Verplaetsen. O processo condenou ainda os repressores Carlos Alberto Tepedino (a 20 anos de detenção), Jorge García (18 anos) e Eugenio Guañabens (17 anos).

Give Earth a Hand

Michael Moore's 'Capitalism: A Love Story'
http://www.hrw.org/en/news/2010/04/19/gunning-judge
Thanks to Garzon, Spain was a symbol of global justice. Now he is falling foul of enemies at home
by

Reed Brody,European Press Director


April 19, 2010

Thirty-five years after the death of General Francisco Franco, Spain is finally prosecuting someone in connection with the crimes of his dictatorship, and of the Spanish civil war which came before it. Unfortunately, the defendant in the case is Baltasar Garzon, the judge who sought to investigate those crimes.

Garzon, of course, is one of the most high-profile judges in the world and what makes the case particularly ironic is that he is being prosecuted for trying to apply at home the same principles he so successfully promoted internationally.

Garzon's daring 1998 indictment of the former Chilean dictator Augusto Pinochet for crimes committed in Chile in the 1970s triggered Pinochet's arrest in London and ushered in the heyday of international justice. Many people contested the right of a judge in Spain, which had never come to grips with its own past, to open up wounds in foreign countries. But the Pinochet case inspired victims of abuse throughout Latin America to challenge transitions from dictatorship which allowed the perpetrators of atrocities to go unpunished.

These temporary accommodations with the anciens regimes did not extinguish the thirst of victims and relatives to find out the truth and to bring their tormentors to justice. International and national courts ruled that amnesties could not stand in the way of a state's duty to investigate the worst international crimes. Justice is now part of just about every transition to democracy anywhere in the world.

Then in 2008, Garzon set his sights inwards. In the last several years, a growing movement has challenged the "pact of forgetting" which was part of Spain's "model" transition to democracy, and the children and grandchildren of victims filed complaints regarding the enforced disappearances of more than 100,000 people between 1936 and 1952. Garzon took up the complaints, saying that under international law Spain's 1977 amnesty law for "political acts" could not apply to crimes against humanity, before an appeals panel ruled 10 to five that Garzon did not properly have jurisdiction. Far-right groups, including one linked to Franco's dictatorship, then accused Garzon of an abuse of power and an investigating judge has just decided to proceed against Garzon for knowingly taking on a case he knew not to be within his jurisdiction.

In his long career, Garzon has made many enemies. Conservatives are gunning for him now because he helped unearth alleged massive corruption in the financing of the opposition Popular party, but many in the Socialist party haven't forgiven him for probing government support for an anti-Eta death squad in the 1980s. The decision by the investigating judge to proceed means Garzon will soon be suspended from his duties. If he is convicted it would effectively end his judicial career.

Prosecuting a judge for issuing a controversial decision, even one overruled on appeal (in a split decision), is a dangerous attack on judicial independence. Many undemocratic rulers would love to use criminal sanctions to silence meddlesome judges. The assault on Garzon (there are two other cases against him in the pipeline) comes on the heels of the Spanish government's decision to curtail its law permitting the prosecution of foreign atrocities which had been used to indict Pinochet, convict an Argentine official for "dirty war" killings, investigate crimes in El Salvador and Guatemala and issue warrants for top Rwandan leaders.

But after cases involving powerful countries such as China, the US and Israel - for alleged crimes in Tibet, Guantanamo and Gaza - created headaches for the Spanish government, both major parties agreed that the law would be limited.

Thanks to Garzon, Spain became a symbol of justice for atrocity victims around the world. Now justice itself may be the victim in Spain.

Reed Brody is counsel for Human Rights Watch and was a lawyer in the Pinochet prosecution

http://www1.folha.uol.com.br/folha/videocasts/ult10038u723811.shtml
20/04/2010 - 23h53

"Sabe quem eu sou? Sou desembargadora!", diz mulher que deu carteirada em blitz

da Reportagem Local

Uma desembargadora do Tribunal de Justiça de Santa Catarina bateu boca com policiais para tentar evitar a apreensão de um veículo conduzido pelo filho. O caso ocorreu durante uma blitz na quinta-feira (15), em Florianópolis. Um dos policiais registrou a discussão em vídeo com um celular. Veja abaixo:

"O senhor sabe quem eu sou?", questiona a desembargadora para um dos PMs. "Não sabe? Sou desembargadora do Tribunal de Justiça", exclama. Leia mais sobre o caso aqui.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u723564.shtml
21/04/2010 - 02h39

Aos 50, Brasília tem de encarar corrupção e falta de planejamento

MARIA CAROLINA MARCELLO
da Reuters, em Brasília

Símbolo de modernidade e fruto do sonho de visionários, Brasília completa 50 anos com um choque de realidade. As formas da capital federal tentam se impor à imagem de um local marcado pela corrupção e que, apesar do ideal imaginado, hoje convive com a desigualdade social e a falta de planejamento.

Acervo UH -21.abr.1960/Folha Imagem
Aviões da esquadrilha da fumaça, da FAB (Força Aérea Brasileira),  fizeram show aéreo na inauguração de Brasília
Aviões da esquadrilha da fumaça, da FAB (Força Aérea Brasileira), fizeram show aéreo na inauguração de Brasília

Idealizada e desejada desde o século 19, Brasília levou apenas 3 anos e meio para ser construída até sua inauguração em 21 de abril de 1960. Se o então presidente da República e seu fundador, Juscelino Kubitschek, encarou a empreitada com empenho e como um desafio a ser superado, o urbanista Lúcio Costa emprestou sua simplicidade ao plano urbanístico e Oscar Niemeyer conferiu plasticidade à capital com seus edifícios arrojados.

* Para Oscar Niemeyer, desigualdade social é o principal problema de Brasília
* Veja capas da Folha sobre inauguração de Brasília
Moradores falam como é viver em Brasília; veja
Ouça novo "hino" de Brasília feito pelo rapper GOG

O sentimento de concretização do sonho não era restrito ao presidente e idealizadores da cidade. Milhares de trabalhadores, chamados de pioneiros ou candangos, deixaram as diversas regiões do país para erguer a nova capital.

Brasília nascia para acolher desde o ministro de Estado até o motorista. A expectativa de seus criadores era de que comportasse uma sociedade relativamente igualitária.

"A cidade tinha, no início, o compromisso de que o coletivo se sobressaísse em relação ao individual", conta o professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Eliel Silva.

"A ideia era que seria possível fazer uma cidade igualitária... se a sociedade também fosse!", afirma Maria Elisa Costa, filha de Lúcio Costa.

O Plano Piloto em forma de avião trazia o que de mais recente havia do urbanismo mundial --a arborização muito presente, as Superquadras, que funcionam como vilas, os prédios residenciais onde o andar térreo é obrigatoriamente aberto e de domínio público.

Centro político

Ao ser construída, Brasília teve como objetivo principal, além de ocupar e povoar o Centro-Oeste do país, o de ser a sede administrativa e política do país. Mas ao tornar-se centro dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, passou a carregar o ônus de conviver com escândalos que têm origem nos gabinetes e corredores das instituições públicas.

"É injusto, a cidade, afinal de contas, não é só isso. O problema é que ela acaba levando esse estigma, ele acaba pesando", reconhece o cientista político da UnB Everaldo Moraes.

E para piorar a reputação da capital, o aniversário de 50 anos tem de dividir as atenções com um caso emblemático: a crise do mensalão do DF, que resultou na cassação do governador e à renúncia do vice-governador. Representantes do Executivo e do Legislativo locais aparecem como suspeitos em um esquema de pagamento de propinas.

Por conta dessa crise, a população de Brasília presenciou, meses antes da comemoração do cinquentenário, a primeira prisão de um governador em exercício no Brasil.

"Brasília era a esperança de algo novo. E de certa forma ela mostrou apenas aquela velha forma de fazer política", critica Moraes.

"Brasília acaba desenvolvendo uma dupla personalidade. De um lado é bonita, moderna, cosmopolita, mas por outro é provinciana, segregacionista. E acaba sendo um reflexo do país, à época imerso em práticas atrasadas", completa o cientista político da UnB Leonardo Barreto.

Problemas urbanos

Além da crise política, a capital enfrenta outros conflitos. Embora o Plano Piloto de Lúcio Costa esteja preservado --Brasília foi tombada como Patrimônio da Humanidade pela Unesco--, sofre influências do crescimento desordenado do entorno.

De acordo com o Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no DF, Alfredo Gastal, a falta de transporte público, a sobrecarga dos sistemas de saúde, educação e a falta de planejamento por parte do Estado geram expectativas pouco otimistas.

"Se o Distrito Federal não se planejar para o futuro, isso não vai funcionar. Sem planejamento, não há tombamento que resista", alerta Gastal.

O problema da falta de planejamento é mais antigo do que aparenta. Mesmo durante a construção da capital, as autoridades da época não calcularam um espaço para a moradia dos candangos e pioneiros. Acomodados em vilas próximas aos canteiros de obras, tiveram de ser transferidos para regiões fora do Plano Piloto, mais tarde conhecidas como cidades-satélites.

"Não se pensou, no início, em planejamento para as pessoas que se deslocaram para construir a cidade em três anos. Quando terminaram a cidade, surgiu a pergunta: 'O que fazer com esse contingente?'", lembra a mestre em Sociologia Urbana da UnB Natália Mori.

A especulação imobiliária de Brasília e das cidades do DF também impediu a concretização da cidade igualitária. As classes mais ricas concentram-se no Plano Piloto, nos Lagos Sul e Norte. As mais baixas foram empurradas para fora do avião.

O alto custo de moradia no centro estimulou a migração para o entorno e ocupações ilegais de terra, inclusive por parte da classe média, que pulverizou as áreas ao redor de Brasília com condomínios irregulares.

No Lago Sul, bairro onde vive a maioria das autoridades, a renda familiar média alcança 19,3 salários mínimos, segundo dados da Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílio (PDAD), de 2004.

Enquanto isso, na região administrativa de Itapoã, uma das mais pobres do entorno de Brasília, a renda familiar média é de 1,6 salário mínimo.

"Houve uma alteração demográfica para qual Brasília não estava preparada. Não havia a expectativa de que o DF crescesse nesse montante. A cidade enfrenta problemas de excesso de automóveis, falta de transporte público, as invasões de terra, os condomínios irregulares, todos decorrentes do modelo de ocupação territorial", critica o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB Geraldo Batista.

(Reportagem adicional de Ana Nicolaci da Costa)

http://agenciabrasil.ebc.com.br/web/ebc-agencia-brasil/enviorss/-/journal_content/56/19523/204322
10:15
21/04/2010

Lógica espacial separa Plano Piloto da periferia e do entorno do Distrito Federal

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasileira

Brasília – A desigualdade social em Brasília gerou processos distintos de urbanização e de usufruto de serviços e equipamentos públicos dentro do Distrito Federal. As diferenças que marcam Plano Piloto e as antigas cidades-satélites (hoje chamadas de regiões administrativas) são determinadas por lógicas espaciais diferentes. Uma com presença forte do Estado e a outra determinada pelo mercado ou pelas relações políticas tipicamente clientelistas.

Para o sociólogo Brasilmar Nunes, ex-professor da Universidade de Brasília (UnB) e atualmente da Universidade Federal Fluminense, a primeira lógica espacial é a “planejada”. Essa lógica ergueu uma cidade protegida pelo tombamento, com um padrão de ocupação mais ou menos homogêneo e sob o controle da burocracia do patrimônio histórico e da vigilância de alguns moradores. Essa lógica é a do Plano Piloto.

A outra lógica é a que o sociólogo chamou de “espontânea” é a da periferia que seguiu a lei de mercado (como no bairro de Águas Claras, com apartamentos de mais de 20 andares) ou se estabeleceu com a “ocupação extremamente selvagem do solo do DF”.

Segundo Nunes, a terra na capital federal “foi usada como moeda política”. Para o sociólogo, “há grupos políticos em Brasília que se firmaram em cima do discurso da invasão, 'invade que eu garanto'. Isso provocou uma migração meio desmesurada no Distrito Federal”, avalia. “Para quem não tem nada o que tem em Brasília é excelente”.

O sociólogo opina que a capital federal tem um sistema político baseado em relações clientelísticas e de favores: “é uma cidade que reproduz o que o Brasil tem de mais arcaico na esfera política”, lamenta. “Há dependência de quadros políticos que garantem esse processo de ocupação de território. O escândalo recente em Brasília é uma briga entre os mesmos que promovem esse tipo de ocupação”, disse se referindo às disputas capitaneadas pelos ex-governadores Joaquim Roriz (PSC) e José Roberto Arruda (sem partido).

Na avaliação de Arquimedes Belo Paiva, coordenador da área de prevenção e mediação de conflitos fundiários urbanos do Ministério das Cidades, Brasília tem um pedaço da população “excluída politicamente, com pouca participação na sociedade civil”. Ele avalia que esse alheamento cívico tem a ver com a segregação social, amplificada pelo tratamento dado pelo Estado aos setores diferentes da população.

O Estado brasileiro ainda é omisso para as ocupações realizadas pelos grupos favorecidos. Temos um Estado repressivo, porém, em relação às ocupações realizadas pelos segmentos mais pobres”, disse citando as invasões toleradas de terras públicas e do Lago Paranoá feitas pelos proprietários de mansões no Lago Sul e Lago Norte (bairros mais nobres de Brasília) e a derrubada de barracos em invasões.

A desigualdade entre centro e periferia em Brasília também se verifica na distribuição de equipamentos públicos como escolas, hospitais e postos de saúde. “A desigualdade vem na esteira da oferta de serviços”, aponta a geógrafa Maria Luiza Peluso, da UnB.

A disparidade observada internamente entre o Plano Piloto e as demais regiões administrativas é ainda maior quando se compara o DF à chamada Região Integrada de Desenvolvimento do Entorno (Ride), formada por 22 municípios de Goiás e Minas Gerais que envolvem o DF.

É comum ver em Brasília ambulâncias desses municípios, e até mesmo da Bahia, trazendo pacientes para atendimento hospitalar. “As pessoas não levam em consideração as barreiras de município. Elas vão buscar atendimento onde for melhor para elas. A finalidade é garantir direitos básicos”, explica Arquimedes Paiva.

Edição: Tereza Barbosa