sexta-feira, 16 de maio de 2008

Ministério Público Federal, 15/05/08
http://producao.prsp.mpf.gov.br/news/internews/news_inter_conteudo0.php?var_id=7138
15/05/08 - Ditadura: MPF-SP move ação civil contra ex-chefes do Doi-Codi

Na ação, o MPF diz que Exército é responsável por sigilo indevido de documentos do Doi-Codi de São Paulo e pede que ex-chefes do órgão sejam pessoalmente responsabilizados por tortura, mortes e desaparecimentos

O Ministério Público Federal em São Paulo ajuizou ontem à tarde ação civil pública contra a União e os dois ex-comandantes do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) do II Exército, em São Paulo, no período de 1970 e 1976, os militares hoje reformados Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel.

O Doi-Codi era o principal órgão centralizador de informações para a repressão à oposição política durante o regime militar e se transformou num dos principais locais de prática de tortura, perpetração de homicídios e desaparecimentos forçados em toda a história do país.

Segundo a publicação ``Direito à Memória e à Verdade´´, da Presidência da República, lançada ano passado, houve 64 casos de mortes e desaparecimentos pelos agentes do Doi-Codi de São Paulo no período em que Ustra e Maciel o comandaram. Entre as vítimas estão o jornalista Vladimir Herzog, em 1975, e o operário Manoel Fiel Filho, em 1976 (veja a lista completa acessando a inicial da ação).

Na ação, o MPF busca aplicar no Brasil conceitos já pacíficos no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização dos Estados Americanos (OEA) em relação a autores de crimes contra a humanidade. A ação foi distribuída à 8ª Vara Federal Cível de São Paulo, sob o número 2008.61.00.011414-5. Nela, os seis procuradores e procuradoras da República que assinam a petição, requerem:

1)O reconhecimento do dever das Forças Armadas de revelar o nome de todas as vítimas do Doi/Codi de São Paulo (não apenas de homicídio e desaparecimento, uma vez que o órgão deteve mais de 7.000 cidadãos), circunstâncias de suas prisões e demais atos de violência que sofreram, bem como tornar públicos todos os documentos relacionados ao funcionamento do órgão;
2)A declaração de que Ustra e Maciel comandaram um centro de prisões ilegais, torturas, homicídios e desaparecimentos forçados no Doi-Codi de São Paulo;
3)Que Ustra e Maciel sejam obrigados a reembolsar à União os custos das indenizações pagas na forma da lei 9.140/95 (lei de mortos e desaparecidos políticos) às famílias das 64 vítimas daquele destacamento durante a gestão dos demandados;
4)Que ambos sejam condenados a não mais exercerem qualquer função pública.

Por enquanto, as únicas pessoas físicas demandadas na ação são Ustra e Maciel em virtude de ambos terem figurado no topo da cadeia hierárquica do órgão repressor, permitindo sua identificação imediata. Os demais agentes envolvidos serão demandados em outras ações, esclarecem os autores, na medida em que forem identificadas suas condutas.

Além disso, o comandante do II Exército no período, Ednardo D´Avilla Mello, e o subcomandante do Doi, capitão Dalmo Cirillo, que poderiam figurar na ação de regresso, já morreram. A ação é cível e não implica em condenação penal.

Para os procuradores da República Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, Marlon Alberto Weichert, Adriana da Silva Fernandes, Luciana da Costa Pinto, Sergio Gardenghi Suiama e Luiz Fernando Gaspar Costa, que assinam a ação, ``a mera passagem institucional de um governo de exceção para um democrático não é suficiente para reconciliar a sociedade e sepultar as violações a direitos humanos ocorridos no bojo de conflitos armados ou de regimes autoritários´´.

Para tanto, é necessário a aplicação de princípios da justiça transicional, que prevêem: o esclarecimento da verdade (abrindo os arquivos estatais relacionados); a realização da justiça, mediante a responsabilização dos violadores dos direitos humanos; e a reparação das vítimas.

Somente com a aplicação desses três princípios - verdade, justiça e reparação - é que se alcançará o objetivo da não-repetição. Para os autores, as medidas de justiça transicional previnem a ocorrência de novos regimes autoritários, pois demonstram à sociedade que estes atos não podem ficar impunes. Cerca de 30 mil pessoas foram presas ilegalmente ou torturadas durante o regime militar brasileiro. Para os autores, a impunidade dos crimes da ditadura é um estímulo aos torturadores do presente.

HISTÓRICO - O Ministério Público Federal em São Paulo atua pela implementação de medidas para a consolidação do regime democrático após o regime militar, desde 1999. Naquele ano, a Procuradoria da República em São Paulo instaurou Inquérito Civil Público para apurar a extrema demora na identificação das vítimas da repressão, cujos restos mortais foram exumadas no Cemitério de Perus, em 1990. Duas ossadas já foram identificadas por meio do trabalho do MPF: as de Flávio Molina e Luiz Cunha.

Nesse procedimento, o MPF se deparou com o amplo desrespeito a direitos fundamentais, seja pela falta de informações sobre as circunstâncias das mortes e das ocultações de cadáver, seja pela inexistência de responsabilização dos agentes públicos autores desses graves delitos. O Brasil não instituiu até hoje mecanismos de apuração dos fatos, como uma Comissão da Verdade, por exemplo.

Em 2005, a ONU recomendou que o país tornasse públicos os documentos relevantes sobre o período e considerasse a responsabilização dos crimes cometidos durante a ditadura. O Brasil não implementou as medidas necessárias e o Procurador Geral da República, Antonio Fernando de Souza, notificou o presidente Lula, em novembro de 2006, sobre o fim do prazo dado pelas Nações Unidas.

Em 2007, o governo brasileiro publicou o livro ``Direito à Memória e à Verdade´´, que o MPF destaca na ação como um valioso avanço. Entretanto, a publicação demonstra que nem mesmo as autoridades civis de direitos humanos do governo conhecem o conteúdo de documentos que seriam indispensáveis para restituir a verdade.

Nesse sentido, o MPF realizou em maio de 2007 o Debate Sul-Americano sobre Verdade e Responsabilidade, em São Paulo, que reuniu juristas do Brasil, Peru, Chile e Argentina. O evento apontou, na Carta de São Paulo, ``a grave omissão da Justiça e do governo brasileiros para cumprir as obrigações constitucionais e internacionais de promoção dos direitos humanos na transição do período de ditadura para o democrático´´.

Após o evento, o professor Fábio Konder Comparato representou ao MPF em São Paulo para que fossem adotadas medidas visando a aplicação do dever de regresso pelo Estado brasileiro em face dos causadores dos danos que geraram o pagamento das indenizações previstas na Lei 9.140/95. A representação, associada à publicação do livro ``Direito à Memória e à Verdade´´, foram elementos decisivos para a propositura da ação ajuizada ontem.

Na representação, Comparato afirma que a ``ação de regresso contra o agente causador do dano é um dever do Estado.´´ Segundo o professor de direito da USP, apesar do elevado gasto com indenizações pagas pela União e por vários estados da federação, nenhuma ação regressiva foi ``intentada contra os agentes ou funcionários causadores dos danos assim ressarcidos com dinheiro público´´.

Acesse aqui a inicial da ação e outros documentos relevantes sobre o caso

Marcelo Oliveira
Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Estado de S. Paulo
ascom@prsp.mpf.gov.br
11-3269-5068

Ustra:
Zero Hora, 16/05/08
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a1864020.xml&template=3898.dwt&edition=9878&section=71
16 de maio de 2008 | N° 15603AlertaVoltar para a edição de hoje

Anos de Chumbo

MP move ação contra ex-chefes do DOI-Codi

Coronéis Ustra e Maciel comandaram órgão nos anos 70

Em um processo que pode responsabilizar militares por torturas, mortes e desaparecimentos durante o regime militar, o Ministério Público Federal em São Paulo ajuizou na quarta-feira uma ação civil pública contra a União e dois ex-comandantes do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do II Exército (hoje Comando Militar do Sudeste), em São Paulo.

Os coronéis do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel, que estiveram à frente do órgão de 1970 a 1976, estão hoje reformados. Na ação, a Procuradoria pede que os dois sejam obrigados a reembolsar à União os custos das indenizações pagas a famílias de 64 vítimas do DOI-Codi durante a gestão deles. O valor total do ressarcimento pedido pelos procuradores é de R$ 7 milhões. A ação solicita que ambos sejam impedidos de exercer funções públicas no futuro.

Os procuradores pedem na ação o reconhecimento do dever das Forças Armadas de revelar o nome de todas as vítimas do DOI-Codi - o órgão deteve mais de 7 mil pessoas. A Procuradoria também quer saber as circunstâncias das prisões e atos de violência e pretende tornar públicos os documentos relacionados ao funcionamento do órgão.

A ação pede uma declaração de que Ustra e Maciel comandaram um centro de prisões ilegais, torturas, homicídios e desaparecimentos forçados no DOI-Codi de São Paulo.

O Ministério Público informou que, por enquanto, Ustra e Maciel são as únicas pessoas citadas na ação porque fizeram parte da chefia do DOI-Codi, o que permitiu que fossem identificados rapidamente. De acordo com o texto encaminhado pela Procuradoria, outros agentes envolvidos serão alvo de outras ações, "na medida em que forem identificadas suas condutas".

Advogado de um dos militares preferiu não comentar ação

Ustra responde a duas outras ações movidas por ex-presos e seus familiares. Ele chefiou o DOI de São Paulo de 1970 a 1974. No período, 47 pessoas morreram sob responsabilidade do órgão.

- Vou esperar a manifestação do juiz sobre a ação antes de me pronunciar, mas é evidente que esta ação tem um peso maior, por ter sido proposta pelo Ministério Público, do que as outras contra meu cliente - disse o advogado Paulo Esteves, que defende Ustra.

Maciel, o outro acusado na ação, sofreu um acidente vascular cerebral na segunda-feira e está internado no Rio. Ele chefiou o DOI de 1974 a 1976. Entre as vítimas desse período no DOI está o jornalista Vladimir Herzog.
Folha de São Paulo, 16/05/08
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1605200812.htm
Anistia não protege torturador, diz Tarso

Ministro defende punição para responsáveis por tortura na ditadura; presidente do Clube Militar afirma que ele quer "tumultuar"

Tarso diz que lei é política e tortura não é crime político; para a OAB, "anistia não envolveria crimes de sangue cometidos pelo Estado"


DA SUCURSAL DO RIO

O ministro da Justiça, Tarso Genro, defendeu ontem o julgamento e a punição dos responsáveis pelos crimes de tortura durante o regime militar (1964-85). Em sua opinião, a Lei da Anistia, de 1979, não protege os torturadores.
O ministro afirmou também que o "sigilo eterno" de documentos secretos oficiais "não serve ao Estado democrático de Direito". A medida restritiva ao acesso público à informação, criada no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, em 2002, foi mantida pela administração petista de Luiz Inácio Lula da Silva.
Ela permite que documentos, inclusive os do regime militar, permaneçam para sempre inacessíveis aos cidadãos.
As declarações de Tarso se opõem à posição das Forças Armadas e de muitos setores do governo. Ano passado, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse que a Lei da Anistia trouxe "conciliação e pacificação".
O Ministério da Defesa informou que Jobim está em viagem no exterior e que ninguém poderia falar pela pasta.
A interpretação política hegemônica, porém controversa, sustenta que a anistia beneficiou os dois lados: funcionários do regime e oposicionistas.

Passado apagado
O presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto Figueiredo, respondeu a Tarso: "Se for pensar assim, tem gente que ocupa cargos de ministro que fez a mesma coisa: torturou, só que pelo outro lado. Roubou, assaltou banco".
Mais: "A Lei da Anistia foi para apagar esse passado. No Brasil, esses casos [de tortura] foram poucos e localizados. Acho que Tarso Genro está querendo tumultuar um pouco, como está tumultuando lá no problema da [reserva indígena em Roraima] Raposa/Serra do Sol".
Tarso discursou no terreno onde funcionou a sede da UNE (União Nacional dos Estudantes) até 1964, na praia do Flamengo, zona sul do Rio.
"Torturadores e genocidas desse país (...) nem sequer foram julgados pelos crimes que cometeram nos porões da ditadura. (...) Teve pessoas de boa-fé defendendo o regime", disse.
"Elas dizem: "A anistia foi feita para todos, inclusive os torturadores". Eu respondo: se ela foi feita para os torturadores, eles têm que ser julgados, que receber uma pena e depois receber anistia."
Em entrevista, Tarso afirmou: "Para tratar dessa questão [punição criminal], não precisaria de mudança na lei. A Lei da Anistia é uma lei política. Ela incide sobre crimes políticos. A tortura não pode ser considerada um crime político".
"Se um agente público invade uma residência na época da ditadura, cumprindo ordem ilegal do administrador autoritário de plantão, e prende pessoas, isso é um crime político originário do Estado de fato vigente naquele momento."
"Se esse mesmo agente público prende essa pessoa e a leva para um porão e a tortura, este crime de tortura não é um crime político, porque nem a legalidade da ditadura permitia o crime de tortura. Portanto, crimes como esse não poderiam estar abrigados [pela Lei da Anistia]. Agora, isso tem que ser uma interpretação do Poder Judiciário. Não é necessário modificar a lei para que esses crimes sejam punidos."
O ministro assinou ontem portaria criando o Memorial da Anistia Política no Brasil. Ele disse ser ainda hoje "militante socialista e revolucionário".
Criticou a cobertura jornalística sobre o trabalho da Comissão de Anistia, que já aprovou reparações no montante -de acordo com seu presidente- de R$ 2,4 bilhões: "Em cima de determinados temas, [existe] uma velada censura a respeito do trânsito de opiniões".
Em dezembro, o ministro dos Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, disse considerar imprescritível o crime de tortura. Porém, não fez a defesa aberta da punição como Tarso.
No evento de ontem, o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cezar Britto, disse que "a posição histórica da entidade é que a anistia não abrangeria os crimes de sangue cometidos pelo Estado". "Embora [a opinião] tenha sido vencida em vários questionamentos judiciais", disse.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Folha de São Paulo, 15/05/08
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u402034.shtml
15/05/2008 - 08h00

10% dos mais ricos no Brasil detêm 75% da riqueza, diz Ipea

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KAREN CAMACHO
Editora-assistente de Dinheiro da Folha Online

O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) elaborou um levantamento que aponta as desigualdades no Brasil. Um dos dados mostra que os 10% mais ricos concentram 75,4% da riqueza do país.

Os dados, obtidos pela Folha Online, serão apresentados pelo presidente do Ipea, Márcio Pochmann, nesta quinta-feira ao CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social). O objetivo, segundo ele, é oferecer elementos para a discussão da reforma tributária.

A pesquisa também mostra como é essa concentração em três capitais brasileiras. Em São Paulo, a concentração na mão dos 10% mais ricos é de 73,4%, em Salvador é de 67% e, no Rio, de 62,9%.

Para Pochmann, a injustiça do sistema tributário é uma das responsáveis pelas diferenças. "O dado mostra que o Brasil, a despeito das mudanças políticas, continua sem alterações nas desigualdades estruturais. O rico continua pagando pouco imposto", afirmou.

Apenas para efeito de comparação, ao final do século 18, os 10% mais ricos concentravam 68% da riqueza no Rio de Janeiro --único dado disponível.

"Mesmo com as mudanças no regime político e no padrão de desenvolvimento, a riqueza permanece pessimamente distribuída entre os brasileiros. É um absurdo uma concentração assim", afirma.

A pesquisa do Ipea também mostra o peso da carga tributária entre ricos e pobres, que chegam a pagar até 44,5% mais impostos. Para reduzir as desigualdades, o economista defende que os ricos tenham uma tributação exclusiva.

Pochmann afirmou que um dos caminhos é discutir uma reforma tributária que melhore a cobrança de impostos de acordo com a classe social.

"Nenhum país conseguiu acabar com as desigualdades sociais sem uma reforma tributária", afirmou.

A pesquisa do Ipea também mostra um dado inédito. A carga tributária do país, excluindo as transferências de renda e pagamento de juros, cai a 12%, considerada por Pochmann insuficiente para que o Estado cumpra as suas funções.

domingo, 11 de maio de 2008

Folha Online, 11/05/08
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u400662.shtml
11/05/2008 - 08h58

Globo vai vetar beijo gay em "Duas Caras", informa Daniel Castro

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da Folha Online

Hoje na Folha A direção da Globo vai vetar a anunciada cena de um beijo gay na novela "Duas Caras", entre Bernardinho (Thiago Mendonça) e Carlão (Gui Palhares), informa Daniel Castro, na coluna Outro Canal, publicada na Folha deste domingo (11), que está nas bancas.

O conteúdo completo de Outro Canal é exclusivo para assinantes UOL e Folha.

A intenção de incluir a cena foi manifestada pelo autor Aguinaldo Silva. Os dois personagens se beijariam em uma cerimônia de união civil, em um cartório, diante de quase todo o elenco.

Para justificar o veto, a Globo se apóia em seu documento interno "Princípios de Qualidade da TV Globo", que não contempla "carícias e beijos entre homossexuais".

O final de "Duas Caras" está previsto para ir ao ar no próximo dia 30 de maio.

sábado, 10 de maio de 2008

Agência Carta Maior, 09/05/08
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=3883

DEBATE ABERTO

O intrépido Coronel Mendes

No Rio Grande do Sul, subcomandante da Brigada Militar mobiliza um pequeno exército para reprimir MST e mobilizações de movimentos sociais. Defensor da pena de morte e da reação a assaltos por parte dos cidadãos, o coronel Paulo Mendes também é autor da máxima: "bandido tem que ir pro paredão mesmo".

Os fatos relatados a seguir estão virando uma rotina no Rio Grande do Sul, Estado considerado por alguns como um dos mais politizados e civilizados do país:

Por volta das 13h, vários policiais começaram a se retirar da São Paulo 2. Mesmo assim, a identificação dos sem-terra continuou. No retorno, ruralistas que estavam na RS-630 saudaram o coronel Mendes, que desceu do carro para cumprimentá-los.

- Gostaríamos de ter assistido. - afirmou a vice-presidenta do Sindicato Rural de São Gabriel, Roselba Mozzaquatro.


O relato acima é do jornalista Homero Pivotto Jr., do jornal Diário de Santa Maria, em matéria publicada dia 9 de maio sobre a operação de guerra que a Brigada Militar montou, no dia anterior, para revistar um acampamento de sem-terra no município de São Gabriel, Fronteira Oeste do Estado. Ao justificar o aparato de 700 homens, cães, cavalos, computadores, comunicação via satélite e helicóptero, o coronel Paulo Mendes, subcomandante da Brigada, disse que era “para a segurança de todos”. Sobretudo para os ruralistas que o saudaram como a um herói, ao final da ação.

Denúncias de autoritarismo, humilhação e sadismo
Já para os deputados Adão Pretto e Dionilso Marcon, do PT, não há nenhuma razão para saudar a atuação de Mendes e sua tropa. Pelo contrário. Segundo o relato dos parlamentares, que tentaram sem sucesso entrar no acampamento, a ação da Brigada Militar foi marcada pelo autoritarismo, pela humilhação dos sem-terra com requintes de sadismo e pela violação dos direitos humanos. Eis um trecho do relato dos parlamentares, que foram ameaçados fisicamente e agredidos moralmente pelos ruralistas da região, quando chegaram na área para tentar acompanhar a ação da Brigada:

“A governadora determinou a mobilização de um pequeno exército de policiais militares (de 700 a 1200 homens), fortemente armados, para revistar o acampamento do MST que fica na Fazenda São Paulo II, área desapropriada em abril pelo Incra. Como não encontraram o objeto de sua busca, "materiais supostamente furtados da fazenda Southal”, o comando da BM, de forma suja, preconceituosa e de total violação dos direitos humanos, humilhou centenas de pessoas em uma histórica e vergonhosa ação. Inicialmente, os policiais proibiram a entrada de pessoas num raio de 4 km da área e se prepararam para revistar as famílias. O argumento era revistar para encontrar supostos objetos tirados da Fazenda Southall durante a última ocupação realizada em 14 de abril. No entanto, como não acharam nada, logo se viu que o objetivo da ação ali era outro: humilhar e violar”.

Começaram lentamente, rasgaram barraco a barraco de cada agricultor. Após, de forma sórdida, colocaram pás de terra nas panelas com a comida cozida, inutilizando dezenas de quilos de arroz e de feijão. O restante da alimentação foi levado pela BM, tornando esse sim, ato criminoso.

Os agricultores não demonstram nenhum tipo de resistência, no entanto, a BM dividiu os acampados em dois grupos. Os agricultores homens eram obrigados a ficar semi-nus com as mãos na cabeça. O outro, de mulheres e crianças, foram separados e obrigados a ficar na mesma posição. Durante duas horas esse foi o jeito que os agricultores foram obrigados a ficar até que fossem "identificados”. Os acampados ficaram por mais de 8 horas semi-nus, sem água ou alimentação. Também não tiveram acesso a nenhum advogado ou representação de direitos humanos que pudesse testemunhar o prazeroso ato de humilhação patrocinado pelo comando da operação”.


Segundo os sem-terra relataram aos parlamentares, em um determinado momento, o helicóptero da Brigada ficou a poucos metros do solo e, num gesto teatral bem ao gosto do coronel Mendes, do seu interior saiu uma bandeira do Rio Grande do Sul. Dionilso Marcon anunciou que denunciará o governo Yeda aos organismos internacionais de Direitos Humanos e detalhará todos os casos de violação do direito à vida praticada pelo governo gaúcho.

A “filosofia” do coronel Mendes
Considerado uma espécie de “Capitão Nascimento” dos Pampas, o coronel Paulo Mendes é conhecido também por suas declarações polêmicas. Como subcomandante da Brigada Militar, já defendeu a pena de morte e a ida de bandidos para “o paredão”. Além disso, em 2007, defendeu que os cidadãos deveriam começar a reagir aos assaltos, contrariando as recomendações da própria polícia que não aconselham esse tipo de comportamento.

Nos últimos meses, Mendes vem se notabilizando também por comandar atos de repressão contra ações e protestos de movimentos sociais e sindicalistas. Admiradora do trabalho do coronel, a governadora Yeda Crusius (PSDB) não quer nem ouvir falar em substituí-lo. Como o personagem central do filme “Tropa de Elite”, Mendes é visto – e se vê – como um líder que está combatendo o crime com mão-de-ferro. Admirador confesso do personagem, o coronel, durante um debate televisivo sobre o filme, resumiu: “gostei muito; é muito realista e tem muita ação”.

A tropa do coronel Mendes tem, de fato, proporcionado "muita ação" à vida política gaúcha.


Marco Aurélio Weissheimer é jornalista da Agência Carta Maior (correio eletrônico: gamarra@hotmail.com)