21/04/2010
Lógica espacial separa Plano Piloto da periferia e do entorno do Distrito Federal
Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasileira
Brasília – A desigualdade social em Brasília gerou processos distintos de urbanização e de usufruto de serviços e equipamentos públicos dentro do Distrito Federal. As diferenças que marcam Plano Piloto e as antigas cidades-satélites (hoje chamadas de regiões administrativas) são determinadas por lógicas espaciais diferentes. Uma com presença forte do Estado e a outra determinada pelo mercado ou pelas relações políticas tipicamente clientelistas.
Para o sociólogo Brasilmar Nunes, ex-professor da Universidade de Brasília (UnB) e atualmente da Universidade Federal Fluminense, a primeira lógica espacial é a “planejada”. Essa lógica ergueu uma cidade protegida pelo tombamento, com um padrão de ocupação mais ou menos homogêneo e sob o controle da burocracia do patrimônio histórico e da vigilância de alguns moradores. Essa lógica é a do Plano Piloto.
A outra lógica é a que o sociólogo chamou de “espontânea” é a da periferia que seguiu a lei de mercado (como no bairro de Águas Claras, com apartamentos de mais de 20 andares) ou se estabeleceu com a “ocupação extremamente selvagem do solo do DF”.
Segundo Nunes, a terra na capital federal “foi usada como moeda política”. Para o sociólogo, “há grupos políticos em Brasília que se firmaram em cima do discurso da invasão, 'invade que eu garanto'. Isso provocou uma migração meio desmesurada no Distrito Federal”, avalia. “Para quem não tem nada o que tem em Brasília é excelente”.
O sociólogo opina que a capital federal tem um sistema político baseado em relações clientelísticas e de favores: “é uma cidade que reproduz o que o Brasil tem de mais arcaico na esfera política”, lamenta. “Há dependência de quadros políticos que garantem esse processo de ocupação de território. O escândalo recente em Brasília é uma briga entre os mesmos que promovem esse tipo de ocupação”, disse se referindo às disputas capitaneadas pelos ex-governadores Joaquim Roriz (PSC) e José Roberto Arruda (sem partido).
Na avaliação de Arquimedes Belo Paiva, coordenador da área de prevenção e mediação de conflitos fundiários urbanos do Ministério das Cidades, Brasília tem um pedaço da população “excluída politicamente, com pouca participação na sociedade civil”. Ele avalia que esse alheamento cívico tem a ver com a segregação social, amplificada pelo tratamento dado pelo Estado aos setores diferentes da população.
“O Estado brasileiro ainda é omisso para as ocupações realizadas pelos grupos favorecidos. Temos um Estado repressivo, porém, em relação às ocupações realizadas pelos segmentos mais pobres”, disse citando as invasões toleradas de terras públicas e do Lago Paranoá feitas pelos proprietários de mansões no Lago Sul e Lago Norte (bairros mais nobres de Brasília) e a derrubada de barracos em invasões.
A desigualdade entre centro e periferia em Brasília também se verifica na distribuição de equipamentos públicos como escolas, hospitais e postos de saúde. “A desigualdade vem na esteira da oferta de serviços”, aponta a geógrafa Maria Luiza Peluso, da UnB.
A disparidade observada internamente entre o Plano Piloto e as demais regiões administrativas é ainda maior quando se compara o DF à chamada Região Integrada de Desenvolvimento do Entorno (Ride), formada por 22 municípios de Goiás e Minas Gerais que envolvem o DF.
É comum ver em Brasília ambulâncias desses municípios, e até mesmo da Bahia, trazendo pacientes para atendimento hospitalar. “As pessoas não levam em consideração as barreiras de município. Elas vão buscar atendimento onde for melhor para elas. A finalidade é garantir direitos básicos”, explica Arquimedes Paiva.
Edição: Tereza Barbosa
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