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17/02/2010 - 11h02
Desarmamento nuclear e não proliferação, duas faces da mesma moeda
Por Janyantha Dhanapala*
Kandy, Sri Lanka, fevereiro/2010 – O único enfoque normativo viável em relação às armas nucleares é o de sua eliminação total e universal sob rígida verificação. Isso não pode ser alcançado a passos graduais, mas em conjunto, mediante a negociação de uma Convenção Sobre Armas Nucleares, tal como recomenda a Secretaria Geral das Nações Unidas.
Atualmente, vislumbra-se a esperança de uma reconciliação do desfeito casamento entre desarmamento nuclear e não proliferação. Tanto o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, como seu colega russo, Dmitri Medvédev indicam repetidamente apoio ao ideal de um mundo livre de armas nucleares. Talvez possamos estar seguindo para uma era de “desproliferação”, a uma mudança de rumo tanto da difusão do armamento como de sua perpetuação e posterior aumento.
O conceito de proliferação de armas nucleares tem duas dimensões: uma horizontal (difusão geográfica) e outra vertical (melhoria dos arsenais existentes). Os Estados que possuem armas nucleares (NWS), há muito tempo destacam a importância de impedir a primeira, mas, ao mesmo tempo, promovem a segunda.
Eis como a coisa funciona. Os NWS expressam seu alarme pela perspectiva real ou imaginada do surgimento de novos Estados nucleares. Para impedir que isso ocorra, insistem na necessidade de realizar cada vez mais maiores controles sobre a proliferação horizontal. Esta ameaça externa artificiosa também serve aos NWS como motivo para modernizar seus arsenais nucleares e adiar por tempo indefinido o desarmamento.
Uma nova dimensão é o possível acesso a armas nucleares por parte de terroristas. Embora seja uma possibilidade real alarmante, esta forma de proliferação foi aproveitada pelos NWS para distrair a atenção sobre suas próprias armas nucleares que, obviamente, não têm valor militar para combater o terrorismo. A questão fundamental é que as armas nucleares são intrinsecamente perigosas nas mãos de quem quer que seja.
Esta divisão de responsabilidade, entre os que têm e os que não têm armas nucleares, também é perniciosa, ao mascarar a realidade de que o desarmamento e a não proliferação são duas faces da mesma moeda.
O surgimento, no século XX, de armas nucleares – as mais destrutivas jamais criadas – marcou uma linha divisória para a humanidade. Daí sua eliminação e seu controle se converterem na prioridade da ONU e da comunidade internacional.
Os tratados bilaterais entre os maiores NWS (Estados Unidos e Rússia), que segundo estimativas possuem 95% destas armas, e tratados multilaterais que proíbem os testes nucleares – como o Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (CTBT), e a proliferação, como o Tratado de Não Proliferação Nuclear (NPT) – tentam regular a proliferação vertical e horizontal, da mesma forma que os tratados sobre zonas livres de armas nucleares forjados por Estados não possuidores (NNWS).
Estima-se que existam mais de 23.300 ogivas nucleares para projéteis de guerra, com Estados Unidos, Rússia, Grã-Bretanha, França, China, Índia, Paquistão e Israel, que em seu conjunto possuem 8.392 projéteis prontos para serem lançados em poucos minutos.
A estrutura normativa com relação a todas as armas tem dois aspectos. Um, o de buscar uma proibição universal para as armas desumanas ou que ameaçam a segurança coletiva. E dois, a busca de um controle de armas em termos quantitativos ou para evitar o surgimento de novos possuidores.
A ilegalidade das armas biológicas e químicas, das minas terrestres, das bombas de fragmentação, das armas a laser e de outras categorias foi alcançada globalmente por meio de tratados multilaterais.
O único tratado que tenta combinar o desarmamento e o controle de armas é o NPT, que é o acordo de desarmamento mais amplamente subscrito no mundo. Aceita abertamente duas categorias de estados signatários, os NWS e os NNWS.
Os NWS estão obrigados, como signatários do tratado, a negociar a redução e eliminação de suas armas. Por sua vez, os NNWS são totalmente proibidos de adquirir tais armas.
Aos NWS é permitido reter suas armas com as restrições estipuladas em outros tratados. Mas, em lugar de cumprirem suas obrigações com o NPT, os NWS buscam impor mais restrições aos NNWS, como uma redução do direito à retirada do tratado e imposição de novas condições para o uso pacífico da energia nuclear.
A descoberta do programa clandestino de produção de armas nucleares do Iraque, no começo dos anos 90, a saída do NPT da Coreia do Norte e suas subsequentes provas de armas nucleares, o reconhecimento e a retificação da Líbia com relação ao seu descumprimento, as persistentes dúvidas sobre um suposto reator nuclear da Síria destruído por Israel, e as contínuas tensões sobre o programa nuclear do Irã, certamente enfraqueceram o NPT como um instrumento para evitar a não proliferação.
Nesta conjuntura, apenas uma reunificação dos enfoques sobre desarmamento e não proliferação pode salvar o tratado. IPS/Envolverde
* Janyantha Dhanapala, ex-embaixador do Sri Lanka e ex-subsecretário das Nações Unidas para o Desarmamento, expressa neste artigo opiniões pessoais.
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