sexta-feira, 16 de julho de 2010

Folha de São Paulo, 16/07/2010
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1607201022.htm
Lei contra homofobia só rendeu 7 multas em 8 anos

Criada em 2001, lei motivou 144 denúncias; 22 resultaram em advertência

Dinheiro da multa vai para os cofres do Estado e não do denunciante; é preciso pagá-la antes para poder recorrer

JULIANA COISSI
DE RIBEIRÃO PRETO

Um casal de rapazes gays entra no supermercado Carrefour de Piracicaba e ouve um dos seguranças dizer aos outros pelo rádio: "Estão entrando dois veados!"
Muitos teriam engolido a ofensa, mas, segundo relatado em juízo pela dupla, os dois: 1) Questionaram o funcionário; 2) Procuraram uma chefe dele, em vão; 3) Por fim, registraram queixa e processaram a empresa.
Com base na Lei da Homofobia, o caso acabou em multa de R$ 48 mil ao Carrefour em agosto de 2008. Em outro caso, o mesmo supermercado foi multado em R$ 15 mil depois que travestis disseram ter sido xingados por empregados do local.
Os exemplos fazem do Carrefour uma exceção no país. Apesar de vigorar desde novembro de 2001, a lei estadual 10.948, que pune quem xingar ou agredir pessoas declaradamente gays, só rendeu sete multas até hoje.
Segundo a Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania, que coordena as ações, foram recebidas 144 denúncias de homofobia até hoje. Dessas, 46 viraram processos que estão em andamento e outras 28 foram arquivadas principalmente por desistência do denunciante, muitas vezes por falta de provas.
Outros 41 acusados -pessoas ou empresas- foram absolvidos. Dos casos condenados, 22 resultaram em advertência. Se há multa, o dinheiro vai para os cofres do Estado. É preciso pagá-la para poder recorrer.
Procurado, o Carrefour diz que não comenta processos e que faz parte de sua política o respeito à diversidade e a "disseminação da importância da valorização das pessoas e suas diferenças."

POUCAS DENÚNCIAS
Até hoje, nenhum bar ou restaurante teve o alvará cassado, uma das penas previstas na lei. A última polêmica envolvendo suposta agressão por preconceito ocorreu em um bar em Campinas na sexta-feira.
Para coordenador de Políticas para a Diversidade Sexual da Secretaria, Dimitri Sales, as multas são poucas porque poucas denúncias são feitas. "Muitos não denunciam, porque não sentem que seus direitos são garantidos", diz.
Irina Bacci, secretária-geral da ABGLT, entidade nacional que representa os homossexuais, disse que falta maior divulgação do Estado para que a lei se torne conhecida. "A divulgação ainda fica nas costas das entidades."

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1607201023.htm
Jovem diz que apanhou e foi chamado de "veado"

DE RIBEIRÃO PRETO

O auxiliar de administração Jonathan do Prado, 19, de Campinas, que se declara bissexual, planeja processar o bar Camp Chopp (centro da cidade), com base na Lei da Homofobia.
Ele relata que levou um golpe na cabeça de um segurança na última sexta-feira. Com a pancada, desmaiou e perdeu muito sangue.
Jonathan conta que entrava no bar com uma amiga e foi parado pelo segurança Gustavo Rodrigues, 43, que exigiu identidade dos dois.
"Minha amiga não estava achando o documento na bolsa e eu disse que era frescura pedir isso. Foi quando o segurança disse: "Ah, é? Agora você não vai entrar, seu veado", e me deu um tapa."
Jonathan diz que, ao se virar, levou golpes de cassetete no braço e na cabeça. "[Amigos] pediram para me socorrer e ele disse: "Que sangre até a morte esse veado!"
Já Mário Brito, sócio do bar, afirma que Jonathan sacou um estilete para golpear o segurança, que se defendeu. Quando o rapaz caiu, o gerente do bar recolheu o estilete e o entregou à polícia.
Jonathan diz que tinha mesmo um estilete, que usa para trabalhar, mas a arma foi retirada de seu bolso quando ele caiu.
A Folha tentou, sem sucesso, ouvir o segurança. Ele está afastado, mas, segundo Brito, não será demitido.

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